Qual deve ser o futuro do Ginga?

Na minha empresa de ticketing recentemente fizemos uma experiência de desenvolver alguns protótipos funcionais para venda de ingressos na TV Digital. As plataformas escolhidas foram a Ginga ( https://en.wikipedia.org/wiki/Ginga_(middleware) ) e HTML5 + Javascript (que estava começando a ser embarcado nas TVs na época em que iniciamos o projeto).

Em primeiro lugar, este post é para debate: o que vou escrever aqui é a minha visão – limitada – sobre o assunto.

Depois de alguns meses eu me pergunto para que lado vai o Ginga. Ao mesmo tempo em que uma equipe de duas pessoas trabalhava para entregar um protótipo com funcionalidades mínimas, um engenheiro de frontend na plataforma HTML5 fez 2 protótipos (LG e Samsung) e revisou um destes protótipos para ficar compatível com as duas TVs (algo semelhante ao mundo Chrome x Firefox x Safari x Internet Explorer). Se eu quiser modificar a aplicação Ginga, eu sei que vai ser um parto. O ambiente de desenvolvimento e o SDK não ajudam. Se eu pedir para modificar o HTML5, uso toda a infraestrutura atual de frameworks para web (ferramentas e bibliotecas)

Se eu quiser publicar minha aplicação, tenho um marketplace da LG ( http://br.lgappstv.com/appspc/main/main/main.lge?lang=por_BR ) e outro da Samsung ( http://www.samsung.com/uk/tvapps/ ). Se eu quiser publicar minha app Ginga, qual o marketplace que eu coloco? Existe mais um ponto: se eu desenvolvo uma app para a TV nas plataformas mundiais, terei um mercado potencial mundial; mas se eu desenvolver para o Ginga ficarei somente com o Brasil.

E olhando o cenário mundial ele tende a ficar mais competitivo e complicado. Uma pequena amostra do que está ocorrendo:

O mercado não está escolhendo o Ginga. Este é o fato.

O que devemos pensar é se esta iniciativa – o Ginga – ainda faz sentido e como adaptá-la aos tempos atuais. Não adianta olharmos números de devices com o Ginga instalado se absolutamente ninguém usa. Devemos olhar alguma métrica de adoção. O percentual de tablets Androids não corresponde ao tráfego que eles geram. As pessoas compram tablets Android e ninguém sabe onde são usados, pois majoritariamente o tráfego que é observado nos sites vem de tablets Ipad.

Esta situação me faz lembrar de um paper recente do Marcos Lisboa e Zeina Latif, a que tive acesso via o blog do Mansueto Almeida.

Nele os autores discutem alguns itens que cabem neste debate (aproveitando a análise do Mansueto):

  1. No Brasil, há um número crescente de mecanismos (“políticas públicas”) que beneficiam grupos organizados específicos às custas da sociedade. Não se trata aqui de corrupção. Se trata de várias políticas de elevado retorno privado e custo social difuso.
  2. Um dos problemas da democracia brasileira é ainda a elevada falta de transparência e de “accountability”
  3. Como medir o benefício destas políticas públicas para a sociedade?

Então, com este cenário. Qual deve ser o futuro do Ginga? E utilizando o Ginga como exemplo, qual deve ser a abordagem no Brasil para avaliação de políticas públicas?

Neste caso específico acredito que o governo deva pensar como um Venture Capitalist. O mercado adotou a tecnologia? Funcionou? Ok, vamos em frente. Não funcionou? Mudou o contexto? Mata o projeto e vamos relocar o dinheiro em algo mais promissor ou em outra fronteira tecnológica.

Finalmente. Eu não sou contra terem desenvolvido o Ginga. Eu acho correto ter sido desenvolvido e tenho certeza que muita gente  de qualidade foi formada no processo, o meu questionamento é sobre o futuro da plataforma e se ainda vale a pena continuar investindo.

7 thoughts on “Qual deve ser o futuro do Ginga?”

  1. Todas as observações feitas no artigo são válidas e bastante ponderadas.
    Vou tentar lembrar e abordar outros pontos importantes.

    O Ginga foi feito para a TV Digital. Sua linguagem, NCL-Lua, não compete com HTML5-JavaScript, pelo contrário, ela embute objetos HTML. O que quero dizer com isso é que a plataforma Ginga não compete com as plataformas de TVs Conectadas, mas as embute e estende. As plataformas de TVs conectadas se restringem a aplicações vindas de portais da Web e isso é muito limitado em um ambiente híbrido, que comentarei a seguir. Da mesma forma, os middlewares de TV digital “tradicionais” se restringem a aplicações e conteúdos transmitidos por broadcast e isso também é limitado, até porque o fazem sem sincronismo da aplicação com o vídeo principal, em uma interação completamente pobre. As duas plataformas são limitadas.

    Não é justo dizer que o Ginga não “pegou”, o que não “pegou” foi a TV interativa como vem sendo feita por “absolutamente todos” os outros sistemas, inclusive aquelas tendo o HTML como base. Todos os sistemas minguaram. Se disserem que a TV interativa como vem sendo feito hoje não “pegou”, eu concordo, mas o Ginga foi e é importante para uma mudança. Então vamos recolocar a discussão em seu verdadeiro eixo.

    O Ginga foi a primeira solução no mundo a tratar de aplicações híbridas integradas (broadband/broadcast), isso em 2007. Só agora em 2013 os radiodifusores do mundo começam a falar em plataformas IBB (Integrated Broadband/Broadcast). Quando começarem a aparecer as primeiras aplicações integradas, vamos todos perceber o quanto é limitado o que se consegue com as TVs conectadas. Quando começarmos a explorar de fato o vídeo principal (o programa de TV) e não apenas usar a tela da TV com um monitor de computador, vamos ver o que é de fato a TV digital. Por que o que se esta fazendo até agora é muito ruim.

    Por ter sido o primeiro a fazer essa integração o Ginga foi adotado pela UIT (International Telecommunication Union) como padrão internacional. Foi a primeira vez que o Brasil teve um padrão adotado na sua íntegra na área de TICs. Isso foi feito não por uma proposição do Brasil, mas inicialmente do Japão. Ginga foi também o primeiro a possibilitar aplicações multidispositivo, em 2007. Só em 2011 começaram a se falar em segunda tela em outras soluções. Ginga era e ainda é o que há de melhor “em tecnologia” para a “verdadeira” TV digital.

    Acontece que o Ginga ficou com seu uso restrito aos radiodifusores que, infelizmente, não souberam tirar proveito de suas vantagens ímpares. Será que a tecnologia veio antes de estarmos preparados para ela?
    Na verdade o Ginga esbarrou em sua primeira grande barreira: a publicação das aplicações e, nesse ponto o artigo acima acerta em cheio. Por mais que equipamentos portem o Ginga, por mais que milhares, milhões fizessem aplicações Ginga, sua distribuição ficava limitada a quatro ou cinco atores. Infelizmente, no Brasil não temos uma TV Pública forte ou um serviço de IPTV capaz de permitir a distribuição de aplicações NCL de forma, digamos, “democrática”.

    Hoje existe um grande número de dispositivos com Ginga, mas concordo mais uma vez com o artigo acima, isso não tão importante assim. Mesmo porque muitas dessas implementações são ruins. Mas é um começo. Quando se começarem a fazer as “verdadeiras” aplicações para as TVs digitais, vamos ver que as soluções das TVs conectadas são limitadas, como são também essas difundidas pelos nossos radiodifusores. Vamos ver, também, que existem muito mais ferramentas de desenvolvimento, para essas novas aplicações, usando NCL, do que usando HTML. Pelo simples fato de que HTML foi feito com um propósito diferente. Nesse ponto das ferramentas eu divirjo do artigo acima, pois ele ignora essas aplicações. No entanto, para notarmos isso, precisam aparecer tais aplicações, que só agora começam a ser pensadas. O Ginga estava muito na frente “tecnologicamente”. Agora ainda está, mas a distância diminuiu muito. Mas não pensem que o Ginga está parado.

    O Ginga não se restringe só ao Brasil. Hoje 13 países adotaram o ambiente Ginga-NCL e vários estudam sua adoção. Publicar para o Ginga é sim publicar internacionalmente. O problema é “publicar”, “distribuir”. Nisso continuamos dependentes de poucos radiodifusores do Brasil e desses outros países.

    Podem ter a certeza que o contexto vai mudar. Talvez a mudança seja rápida e o Ginga sobressaia como sucesso comercial, como já sobressaiu no mundo das ideias, da pesquisa. Talvez demore muito, o Ginga não evolua e apareçam soluções melhores. Talvez a mudança seja tão mais radical que mesmo o que antevejo seja muito pouco avançado. Mas que vai mudar vai. A TV certamente não será essa que vemos nas TVs conectadas e nem nas pobres transmissões hoje difundidas.

    Como bem reconhecido pelo artigo, o Ginga é um sucesso “total”, só pelo que já deu hoje ao país: formação de mão de obra qualificada, pela obrigação de empresas que eram apenas montadoras a desenvolverem tecnologia no Brasil, criação de empregos e empresas (várias as que hoje fazem aplicações para TVs conectadas nasceram por causa do Ginga), além de levar o Brasil ao cenário mundial da tecnologia de ponta.

    Precisamos ter orgulho do Ginga pelo que ele representa. Mesmo que não “vingue”, o Ginga teve várias de suas soluções adotadas em outros sistemas. Suas contribuições foram ímpares, seus conceitos sempre estarão presentes. Investir no Ginga, e digamos de passagem foi “muito pouco”, foi acertado. Continuar esse investimento é importantíssimo se soubermos discernir que o grande fruto das inovações são as ideias, os recursos humanos formados. Nisso o Ginga é campeão e tem muito mais ainda a contribuir no futuro. Mas tem a contribuir também como produto comercial, mas aí o fato de ser um sucesso tecnológico não é fator determinante.

  2. Cumprimento o Camilo, autor do artigo, e o Luiz Fernando pelo seu comentário. Ambos corretos e muito bem ponderados. Digo ainda que são bastante ricos se pensados como exemplos no âmbito de formulação de políticas para o setor em nosso Brasil. Entretanto, neste ponto é que o País fica à deriva. Não consigo citar algo nessa direção. As últimas políticas de Estado que me lembro (que deram certo, ou não) remontam a mais de 30 anos: Proalcool, Programa Nuclear, Informática, etc. As mais recentes iniciativas forma mais de governo do que de Estado. Algumas delas nem de governo. Ficaram melhor enquadradas como do executivo de plantão. No caso de C&T&I isto significa um desastre, tanto para os grupos de p&d como para atração dos investimentos do setor privado. Acho que o caso abordado se enquadra um pouco neste caso. Outras áreas estão passando por algo parecido, como o pré-sal cujos investimentos não ocorrem devido a instabilidade no marco legal para o setor.

  3. Camilo,

    Não esqueça de considerar tb que a Google está entrando mais pesado neste mercado com a Google TV e o recém lançado Chromecast, que custa apenas $35.00 e é compatível com qq televisão que possua uma entrada HDMI.

    Já estou desenvolvendo algumas coisas para a plataforma da Samsung (como projetos pessoais mesmo) e mais recentemente comecei a pesquisar e estudar sobre a Google TV e apps para o Chromecast. Não posso opinar sobre outras plataformas (como a da LG, por exemplo), mas posso afirmar que as coisas estão evoluindo bastante (sobretudo na plataforma da Samsung).

    Desde o ano passado a Samsung disponibilizou em seu SDK novas API’s para acessar os recursos mais novos de sua linha de TV’s, como reconhecimento de voz, imagens e de gestos. E estas API’s já foram atualizadas no novo SDK deste ano para dar suporte a outros nos recursos, sobretudo gestuais (como pinch zoom em imagens, por exemplo).
    Já o Ginga…..

    Muito bom post, parabéns!

    Abs!

  4. @Eratostenes Araujo “Políticas de Estado” já não funcionam há umas boas décadas (se é que funcionaram um dia). Mas tecnologia é isso mesmo: A grande maioria vira esterco, de onde floresce, futuramente, alguma coisa boa.

  5. Ainda que atrasado, eu gostaria de comentar:
    Com os meus 25 anos de atuação em TI, vejo que usar o GINGA com todo o respeito, é como aprender e querer fazer um grande programa em COBOL, quase niguém mais usa, exceto alguns nichos, se você for focado na neccessidade dos usuários, verá que a industria em geral, em resposta a isso, ja está se mobilizando e remodelando a TV para as novas modalidades de uso e interatividade, vide YOUTUBE, VIMEO, CNNTV, NETFLIX, AMAZON TV e etc. todos sem nada de GINGA e talvez sem a TV, fica ai a questão, Para que?

Comments are closed.